3 de fev. de 2010

Obama sofre hoje para alterar as regras da sociedade americana, muita mais conservadora (por ser mais rica) que a nossa. O que esperar de quem elegeu Bush duas vezes, sem contar o pai. Uma família ligada a cartéis petrolíferos que promoveu duas guerras no Oriente Médio sob pretextos diferentes, com o objetivo de controlar os preços dos barris, e pregando o democratismo. 

O mesmo país que promoveu e financiou todas as ditaduras da América latina, inclusive a brasileira. Obama tenta copiar o modelo brasileiro do SUS, enquanto aqui nunca foi implantado, ainda mais quando muitos governos municipais e estaduais adotam a linha da terceirização pelo embuste das Organizações Sociais, com legitimidade questionada e que um dia será julgado pelo Supremo. 

Lá nos EUA, praticamente não existe saúde pública. As corporações que vendem as assistências médicas privadas não querem um Estado garantindo direitos aos mais pobres e à classe média. Lá se prega que Estado e mercado não devem se misturar. Porém, com uma crise como a de 2008/2009, o mercado mundial foi salvo pelas intervenções dos governos, inclusive o nosso. Lembrem que a crise, como as anteriores foi criada por aqueles que não querem saber do Estado se intrometendo e criando regra. Começou com a especulação imobiliária nos EUA. Como sempre os especuladores que querem ganhar o máximo no menor tempo possível, quando a coisa vai estourar eles tiram toda a grana do mercado e a escondem para reduzir seu prejuízo. Os governos tiveram de salvar os bancos. O lucro é privado, o prejuízo é socializado. Parece que as regras antigas do capitalismo (de regulação pelo mercado) se provaram somente verdadeiras quando se pretende a concentração de rendas. Mas os EUA com fundação protestante vai sempre defender os ideais capitalistas. Como escreveu Max Weber em seu livro “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, foi a reforma protestante que permitiu a dominância do capitalismo como modelo econômico. Se a vocação (para o trabalho) é uma dádiva divina, trabalhar e acumular dinheiro é aproximar-se de Deus. Os ricos (prósperos) não são ricos à toa, eles estão mais próximos de Deus. Nesse contexto parece errado atrapalhar o acúmulo de capital de quem é rico. Segundo a doutrina que construiu o capitalismo, somente se é pobre por uma fraqueza espiritual. É ainda a concepção liberal, estabelecida com a Revolução Francesa, segundo a qual, o Estado democrático é justo por si mesmo, garantindo que todos sejam iguais perante a lei. Essa concepção em sociedades como a americana, ou a nossa, propagam o mito de que as mesmas oportunidades são oferecidas a todos, desconsiderando questões sócio-históricas como o passado escravocrata e colonialista, o racismo, os preconceitos de classe, a cultura de dominação de valores (brancos, masculinos e heterossexuais).
 Aqui no Brasil, superamos a crise, considerada por especialistas, pior que a de 1929. O fizemos melhor do que os países desenvolvidos e que os países em desenvolvimento, exceto pelo China, que continua crescendo baseada na exploração de ex-camponeses, desrespeitando os direitos humanos, a liberdade de expressão, mas sem ser questionada pelo Ocidente capitalista. Só importa o quanto a China cresce. Quem está ganhando com isso, lá e (principalmente) fora de lá, não importa. Superamos pela intervenção do Estado.  O Governo Brasileiro, não só manteve, como ampliou o crédito, controlou o câmbio, garantiu maior autonomia ao Banco Central e a compra de bancos com dificuldades pela Caixa Federal e Banco do Brasil. Permitiu a entrada destas instituições no setor automotivo e a injeção de mais dinheiro na construção civil, além de redução de impostos em setores estratégicos. A política exterior do Brasil, nos últimos anos, abriu o mercado para novos parceiros ampliando as exportações e reduzindo a dependência do mercado americano. Mas não foi só essa a receita do sucesso, a contínua valorização (real) do salário mínimo e a injeção de dinheiro dos programas ditos assistencialistas e            obras do PAC em regiões menos privilegiadas tem auxiliado a garantir um crescimento do Nordeste equivalente ao da China. Ações estratégicas aliadas a um plano econômico eficiente vem reduzindo diferenças no Brasil, e com crescimento. Em 1992, a classe média era um terço do total da renda brasileira. Hoje, é mais de 50%. Entre 2003 e 2008, 32 milhões de brasileiros, ou seja, metade da população da Franca, ingressou no conjunto das classes A, B e C. O principal fator dessa ascensão não foram, é claro, os programas assistenciais, mas a renda do trabalho.  Entre 2003 e 2009 foram criados 8 milhões de empregos com carteira assinada. Foi uma década da redução da desigualdade. Entre 2000 e 2008 a renda dos 10% mais pobres da população cresceu 72%. Ou seja, o crescimento da renda dos pobres no Brasil é um crescimento de tamanho chinês. A renda dos 10% mais ricos cresceu 11%. Todo mundo cresceu. E não é uma bolha. Esse processo já dura cinco anos: de 2003 a 2008 a renda do brasileiro cresce 7% ao ano. A renda sobe por causa do trabalho e porque os brasileiros passaram a estudar mais. Veja mais detalhes do crescimento do Brasil na entrevista com o professor Marcelo Neri, economista e chefe do Centro de Pesquisas Sociais da FGV-RJ em “Neri: classe média é maioria, desigualdade diminui e o Brasil já decolou”.
Assim, quando um país se propõem a crescer a partir de base da pirâmide, o que vemos são os mitos criados por uma elite temerosa, caindo por terra, um a um. Essa elite está disputa a usar todas as suas armas e mídias disponíveis. Seus preconceitos surgem à tona e acabam autorizados e legitimados. O crescimento do Brasil, reconhecido lá fora, e ridicularizado internamente, já não tem como ser escondido. Bolivianos tomam os espaços que um dia foram de nordestinos, trabalhando (e ganhando) como chineses operários em oficinas clandestinas. O Ministério do Trabalho diz que é crítica e crescente a situação dessas pessoas, consideradas como de escravidão. Imagino que em menos de uma década, eles serão alvo do racismo paulistano. Por enquanto eles são úteis, pois alimentam a indústria da confecção com sua mão de obra quase gratuita (como a da China, não é questionada), como já aconteceu com os nordestinos que ergueram arranha-céus em São Paulo. O dia em que os bolivianos e seus filhos exigirem direitos, se tornarão um estorvo. Alvo de piadas e de todo o desprezo. Ai se um descendente deles resolver disputar a Presidência  em 2050. Talvez seja eleito somente em 2062. Que mídias existirão até lá para atacá-lo?
 
Sérgio Ricardo Antiqueira

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